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As editoras e o descaso com as armas de fogo

por Ricardo M. Andrade
11 Minutos de leitura

Sejam bem vindos de volta leitores! Não sei se perceberam mas houve uma grande alteração no layout de nosso blog e espero que tenham gostado. Preferi deixar menos texto para ser lido na chamada de cada artigo e deixar com um visual um pouco mais moderno, a tela mais cheia, um pouco mais poluída, porém, de mais fácil acesso e visualização. Pois bem, este artigo vem a ser um dos primeiros deste ano, já que até então não venho atualizando muito o blog, mas, após ler alguns materiais sobre armas de fogo, principalmente os que foram traduzidos para português, senti uma certa indignação com o descaso com o tema que as editoras tem e aqui estamos de volta.

Sempre que passo em frente a bancas de revistas passo olhando para seu interior, procurando algum material voltado para as armas de fogo, sejam as já aclamadas Revista Magnum e Tiro Certo, ou novas revistas e almanaques. Desta vez não foi diferente. Fui buscar minha namorada na aula e acabei passando em frente a uma banca de jornais, olhei lá para dentro e me deparei com o “Almanaque Ilustrado de Armas de Fogo”, Editora Geek, com 74 páginas divididas em 5 tópicos: Top 10 pistolas 9mm, Top 10 rifles e espingardas, Análises de Armas, Top 10 curiosidades e Top 10 design. Apenas pelos tópicos já conseguimos imaginar o que vem por aí, uma pena a revista estar lacrada e eu só conseguir ver isso após comprá-la, uma enorme pena.

Logo no primeiro tópico já é possível visualizar que o texto publicado por esta editora é estrangeiro, traduzido por alguém que conhece pouco ou nada do assunto em questão. Textos voltados quase que exclusivamente para o públicos que tem acesso facilitado às armas de fogo e que pagam um preço justo por elas, ou seja, não estão falando do Brasil e com erros grotescos e escandalosos.

Foto 27-07-15 14 06 28A PT92 é um grande lançamento da Taurus sim, mas do início dos anos 80, não de 2014 como dito pelo tal artigo. A Taurus PT92 foi a primeira pistola fabricada pela Taurus com sua marca impressa, pois, até então, ela fazia armas para a Beretta que tinha uma antiga sede aqui, após a compra da totalidade das ações da Beretta a Taurus começou a fabricação e impressão de sua marca nos modelos de armas fabricados. É nítida a semelhança entre a Taurus PT92 e a Beretta 92FS, pois ela nada mais é do que uma cópia do projeto original com algumas modificações, como a trava do cão, que no modelo original fica bem em frente ao cão e na Taurus logo acima da empunhadura. A Taurus PT92, assim como sua “irmã” PT99 e outras armas da mesma família como a PT58, 59, entre outras, é sim uma arma boa, porém, produzida a mais de 30 anos atrás. E hoje sua produção foi tomada pela fabricação da nova PT92AF, com trilhos táticos e outras modificações.

texto igualEu me recuso a comentar sobre isso. Aumentem a imagem e vejam com seus próprios olhos.

 

 
Foto 27-07-15 14 14 11De todos, este é o erro mais nojento contido em todo este almanaque. Sim, nojento! O texto fala um pouco do renomado fuzil M16, na plataforma AR, mas na foto mostra-se um marcador de paintball Tippman X7 Phenom. Não precisa ser nenhum entendedor de armas para constatar isso, reparem no corpo da arma, logo atrás do hand guard da mesma é NÍTIDA a inscrição deste nome. Logo abaixo da empunhadura da arma vemos o local que se enrosca o tubo de ar comprimido do marcador.

É sério mesmo que o revisor deste almanaque deixou passar isso? É SÉRIO? Não estou falando que precisa ser um cara com um entendimento sobre-humano sobre armas, não, basta ter o mínimo de atenção no que se está publicando, é só isso! Chega a ser ridículo que uma editora que se declare séria após publicar tal absurdo.

Foto 27-07-15 14 14 15Um AK-47 que mais se parece com um LAR-47 da Delta Carbine, uma mistura entre o upper e a coronha da plataforma AR e o lower da plataforma AK. Utilizando o mesmo calibre do AK, 7,62x39mm, mas com um visual totalmente diferente, mais ‘tático’, vamos lá, é só jogar no google, ‘AK-47’ que imagens mais próximas ao fuzil original irão surgir, nem que sejam do AK-74 ou outras armas da família AK, mas que sejam mais próximas ao modelo principal.

 

 

 

São erros assim que apontam o total descaso pelo tema, estas páginas acima que comentei são apenas uma das páginas que contém erros absurdos da nossa literatura, mas neste caso o almanaque é todo cheio de erros de tradução, palavras sem sentido no meio do texto, entre outras coisas. Mas não é só ele que nos mostra este abandono. Livros como “SEAL Team Six” de autoria de um ex militar da marinha norte americana, que participou desta equipe, “Howard E. Wasdin” publicado pela editora SEOMAN aqui no Brasil e traduzido pela Drago, é um outro exemplo de erros de tradução na literatura de temas correlatos a armas de fogo.

Este livro foi minha namorada quem me deu de presente de aniversário (recomendo a leitura a todos, é muito bom mesmo),  e nele pude notar principalmente os erros de tradução. Uma parte dizem que no percursor da Sig Sauer P226 Navy há uma âncora gravada, sendo que na verdade esta âncora se encontra no ferrolho da arma e lendo a versão original ficou nítido que o erro foi cometido por falta de conhecimento do tradutor, afinal está escrito exatamente isso: “My sidearm was the SIG SAUER P-226 Navy 9mm. It has a phosphate corrosion-resistant finish on the internal parts, contrast sights, an anchor engraved on the slide, and a magazine that holds fifteen rounds.” Enquanto na versão em português, a mesma passagem diz o seguinte: “Minha arma de apoio era uma SIG SAUER P-226 Navy 9mm. Ela possui um acabamento anticorrosão, de fosfato, em todas as suas partes internas; alça e massa de mira, com o desenho de uma âncora gravado no seu percursor e um pente capaz de conter 15 cartuchos…”

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Sig Sauer P226 Navy, como podem ver, a âncora está gravada no FERROLHO da arma.

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Percursor da Sig Sauer P226 Navy, como pode ser observado, não há NENHUMA âncora gravada nele.

 

 

 

 

 

 

 

 

Além de mencionarem a parte errada em que a âncora está gravada, erraram também ao chamar de arma de apoio, quando, na verdade, o mais correto seria arma secundária. Tirando as traduções utilizando da palavra pente e bala como forma principal para citar o carregador e a munição, essas duas nomenclaturas já foram muito discutidas em fóruns e comunidades online e eu já participei de várias dessas discussões. Ainda há muita divergência sobre o emprego destas palavras, mas sou a favor da aceitação delas, afinal, são referidas no dicionário, também, como peças de uma arma de fogo, porém, por estarem tecnicamente mal empregadas, deveriam ser usadas de forma secundária, apenas para não repetir a mesma palavra na mesma frase ou parágrafo, e como principal deveriam ser utilizadas as palavras corretas (carregador e munição), mas infelizmente não é o que acontece na maioria dos casos em nossa literatura.

pente

Referência a pente e bala pelo dicionário Aurélio.

Mas não pensem que os erros de tradução são exclusividade de livros. A dificuldade em se diferenciar um fuzil de assalto de um rifle de precisão, e os problemas com a tradução automática sem a devida revisão estão na TV e cinema também. Um caso recente que consigo me lembrar para citar foi de um episódio do programa chamado “Trato Feito Luisiana” transmitido pelo canal de TV  “History Channel”. No episódio, um cliente vende um fuzil M4 para a loja e eles o customizam colocando mira holográfica, carregador de maior capacidade, mira a laser, lanterna tática, entre outros acessórios, e logo quando o vendedor pergunta as modificações feitas, o especialista lhe diz dentre todas as coisas. “…Coloquei também uma revista de 30 voltas…” uma revista de 30 voltas? No exato momento eu não entendi direito, achei que tinha ficado louco, mas segundos depois caiu a ficha: ele quis dizer que o fuzil tinha agora um carregador com a capacidade de 30 munições, ou seja “A 30 rounds magazine“, erro absurdo que só um tradutor automático poderia cometer.

O que me choca nisso tudo é que os supervisores e revisores não se dão o trabalho de checar o que foi feito, a chefia que contrata tradutores não tem a boa vontade de contratar alguém que seja entendido no assunto, um colecionador, um atirador, não sei, há tantas pessoas boas neste meio que poderiam ajudar de tantas formas estas empresas, porque não contratá-los? Um canal com abrangência internacional que não tem a capacidade de verificar em qual contexto as palavras estão sendo inseridas, simplesmente às jogam lá, como se aquilo não fosse importante.

Para a literatura, televisão e cinema brasileiro, o mundo das armas é um mundo desolado, esquecido e negligenciado. Não veem que tem pessoas que notam estes erros absurdos e que podem parar de consumir os produtos vendidos por eles, já que jamais voltarei a comprar qualquer outra revista, almanaque, ou algo do tipo que seja lançado pela mesma editora. JAMAIS. E tenho certeza que eu não estou sozinho nessa. Eles perderam um grande número de vendas, esse mercado tem consumidor e colecionador! As revistas Magnum e Tiro Certo, são um ótimo exemplo de como fazer da forma menos errada ou mais certa. Posso contar nos dedos, ás vezes que pecaram nesse quesito, isso QUANDO pecam, pois os casos são realmente raros, mas é claro, como errar quando a revista é escrita por verdadeiros especialistas no assunto?

Uma sugestão que uma amiga que trabalha neste meio me deu, e acabou fazendo parte da minha caixa de enviados, foi a de enviar e-mails às editoras que publicam livros constando tais erros, os apontando e corrigindo.  Mostrando que uma escrita mais técnica e séria a respeito deste assunto é necessária e que devem e PRECISAM contratar pessoas que sabem do que estão falando e não alguém que vai jogar as palavras em um tradutor qualquer e escrever aquilo no livro, sem se importar com o sentido da expressão ou texto.

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1 Comentário

GILTER DONIZETE 07/10/2015 - 22:12

REALMENTE FALTA MUITO NO BRASIL EM RELAÇÃO A LIVROS TÉCNICOS E SÉRIOS SOBRE ARMAS DE FOGO ,NO MOMENTO SO CONHEÇO 2 SITES SOBRE ARMAS NO BRASIL QUE SÃO SÉRIOS O SEU FIREARMS E ARMAS ONLINE ,VOCÊS FALAM COM SERIEDADE SOBRE AS ARMAS EM GERAL ,MEUS PARABÉNS.OBRIGADO

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